sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

CRÓNICA - O EFEITO OBAMA

O dia 20 de Janeiro de 2009 constará dos livros como uma data a que a história dará destaque.
Esse lugar proeminente decorrerá não de uma catástrofe, como infelizmente a maioria das vezes, mas permanecerá como um dia em que a esperança caminhou na direcção da realidade.
A eleição de Barack Obama como o primeiro presidente negro dos Estados Unidos da América – actualmente a potência que se assume como líder – galvanizou não apenas essa nação, mas o mundo.
Vi, fugazmente, a transmissão televisiva dos principais momentos da tomada de posse. Aquele mar imenso de gente que – sob temperaturas negativas – estoicamente permaneceu para assistir ao momento que consideravam um pedaço de história, é, por si só, inspirador.
Não me surpreenderá que nos próximos dias uma trupe de pseudo-intelectuais venha comentar esta exuberante manifestação de cidadania e apoio ao presidente eleito, adjectivando-a de saloia e desajustada de um país civilizado e evoluído.
Confesso que a mim me comoveu. Quando e onde em Portugal, no passado recente, se assistiu a tamanha adesão à eleição de um dirigente político. Mais, que políticos temos no nosso reportório capazes de, no futuro, apelar a movimento semelhante?
Barack Obama não conseguirá, creio, estar à altura das expectativas criadas. Não por desvalor seu, mas tão-somente porque as que foram criadas são tão altas que, neste momento civilizacional de crise e recessão, só superando-se o conseguiria.
Caso a realidade venha a desmentir-me, assumirei o meu engano com agrado e felicidade. Gostemos ou não, enquanto se mantiver esta ordem mundial, a estabilidade dos EUA contagia a Europa, e desde logo, nos merece atenção.
Não obstante a probabilidade séria de que fique aquém das expectativas, o homem é já um vencedor que merece o respeito de todos.
Contra as probabilidades, tendências, sondagens e previsões dos maiores especialistas – inclusive os seus simpatizantes – apenas um par de anos após a sua primeira eleição para o senado americano, teve a grandiosa ousadia de assumir-se como candidato democrata à Presidência. Concorrendo contra adversários fortíssimos, como a senadora Clinton, persistiu, convenceu e aguentou.
A chave desta vitória, penso, deveu-se a um discurso de esperança, de união, de integração, de tolerância e, especialmente, de intransigência na defesa de princípios fundamentais da sociedade, designada e especialmente, o respeito pela dignidade humana. Defendeu acertadamente que a grandeza de um país não se faz à custa da submissão de outros. Que o respeito não se confunde com medo. Que tortura é tortura, errada seja qual for a circunstância.
E com isso venceu!
Tenhamos a sabedoria de aproveitar o efeito Barack, encontrando internamente os nossos Obamas, agitando as esperanças e as convicções. Tragamos à política novas vozes, novos modelos, novas crenças.
Numa fase de pessimismo crónico e colectivo, desafortunadamente justificado, é preciso que apareçam de entre nós aqueles que se sentem capazes de sonhar mais além, cativando e contagiando os menos interessados.Só assim se mudarão, para melhor, as más realidades que todos os dias criticamos.
dc@legalwest.eu

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

CRÓNICA - CHUMBO DO PERÍODO EXPERIMENTAL

Considerei na altura, e mantenho a mesma posição, que a revisão da legislação laboral operada com o Código do Trabalho de 2003 foi, politicamente, uma guerra de “muita parra e pouca uva”. Já então, assisti a um profundo desgaste político do governo em troca de alterações que, na sua maioria, pouco traziam de fracturante.
Volvidos cerca de 5 anos, foi agora aprovado um significativo pacote de alterações ao código. Entre várias que aqui poderiam ser enunciadas, ressalto a intenção de aumentar o período experimental normal de 3 para 6 meses, entretanto chumbada pelo Tribunal Constitucional.
O período experimental de um contrato de trabalho, permite a qualquer das partes, no seu decurso, “acabar” com a relação laboral sem aviso prévio – regra geral – nem invocação de justa causa, sem que isso gere direito a qualquer indemnização.
O Tribunal Constitucional, no seu chumbo, entende que a vingar tal medida, violar-se-ia o princípio da proporcionalidade, Constitucionalmente protegido, alertando para o facto de que “nenhum elemento existe, nos antecedentes legislativos, que permita, por um lado, identificar uma insuficiência manifesta dos prazos actualmente em vigor e, por outro, uma justificação para o alargamento de 90 para 180 dias do prazo de período experimental aplicável nos contratos de trabalho dos trabalhadores indiferenciados”
Não posso deixar de concordar!
Se há acto político que me merece censura é o de querer meter pela janela o que não se teve coragem de fazer passar pela porta.
Como é evidente, não há nenhuma razão séria e respeitadora do conceito de “período experimental” que justifique – nos casos de funções indiferenciadas – a sua passagem para os 6 meses, como pretendeu o legislador.
O que será legítimo concluir é que, sentindo a necessidade de flexibilizar o regime da contratação e despedimento, o legislador encapotou no período experimental o que até agora se fazia com contratos a termo, os quais, diga-se, são em número significativo, ilegais.
A legislação laboral portuguesa é, na minha opinião pessoal, desadequada da realidade dos dias actuais, criando ao empregador dificuldades que este não devia ter. A acrescer a isso, a prática conhecida da aplicação dessas leis vai no mesmo sentido, aumentando as dificuldades.
Em duas palavras, certa ou erradamente, o sentimento que grassa entre a população é de que, mesmo coberto de razão, para que um empregador sobreviva com sucesso a um processo no tribunal de trabalho é preciso (quase) um milagre.
Agora, todas essas realidades, e muitas ficções, não se resolvem subvertendo conceitos jurídicos nem encapotando vontades políticas.
A legislação laboral de uma sociedade assente na economia – como é a nossa – assume enorme relevo, sendo absolutamente essencial não só para incentivar o investimento, mas também para assegurar a criação de um tecido social equilibrado.
Exactamente por isso, não pode abrigar ambiguidades e truques que fragilizem a sua credibilidade, sob pena de perder parte significativa do seu propósito.
Ao Estado fiscalizador e punitivo deve aplicar-se o provérbio, “se queres manter limpa a tua cidade, começa por varrer diante de tua casa”.