quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

CRÓNICA: NOVA LEI DAS RENDAS

O temido ano de 2012 começou. Entre as suas mudanças, a alteração na lei das rendas mereceu uma especial atenção mediática.
Desde logo, é bom esclarecer que nenhuma lei há, ainda, em vigor.
O conselho de ministros aprovou a proposta de lei, com as intenções do governo, mas que desde este momento até à sua aplicação, ainda passará por vários crivos. Portanto, nada está diferente, para já.
Mas, caso a versão final seja em moldes semelhantes aos do documento agora aprovado, as implicações sociais são várias, e importantes.
A modificação que mais assusta os inquilinos, é a alteração dos prazos do contrato e actualização das rendas antigas. Estas, ou muitas delas, congeladas durante décadas, têm valores irrisórios, que normalmente são inferiores à conta da água ou luz.
A ser como agora se pretende, essas rendas deverão ser aumentadas por acordo directo entre o senhorio e o inquilino.
O senhorio propõe uma nova renda e o inquilino querendo, contrapropõe. Caso não se alcance acordo, o senhorio poderá acabar com o arrendamento, pagando ao inquilino uma indemnização correspondente a 60 rendas, tendo por base o valor médio das duas propostas.
Prevêem-se, no entanto, excepções a esta regra, quer nos casos em que o inquilino tenha mais de 65 anos ou um grau de incapacidade superior a 60%, quer quando o rendimento do agregado for inferior a um valor que actualmente corresponde a cerca de € 2500.
Nestes casos a mudança do regime do arrendamento, bem como a actualização do valor das rendas está sujeito a regras mais cautelosas, com prazos de modificação mais alargados.
Também, novas regras há quanto à tramitação dos despejos e a duração mínima dos contratos. Os antigos contratos “perpétuos” tendem a desaparecer e a liberdade das partes, senhorio e inquilino, contratarem pelo prazo que bem entendam, passará a ser a regra.
Falta agora ver as modificações que ainda poderão ser introduzidas no diploma, antes da sua entrada em vigor. Também, e da maior importância, a aplicabilidade pratica das regras que venham a ser implementadas. Escrever no papel e fazer na vida real, tem o passado demonstrado, são realidades bem diferentes.
Mas, mesmo nesta fase do anúncio, muito se tem dito sobre a “injustiça social” da alteração da lei das rendas. Convenhamos que, muitos dos comentários confundem as funções sociais do Estado com a solidariedade, voluntária, dos privados.
Ninguém é insensível ao facto de, num período tão exigente como o que atravessamos, muitas famílias não estarem preparadas para mais um agravamento dos seus custos. E isso, por atendível, deve ser acautelado, no possível, pelo Estado.
Mas nenhuma justiça há em obrigar, por via legal, um privado, proprietário, a ver um imóvel seu ocupado, eternamente, a troco de meia-dúzia de euros que não pagam, sequer, os impostos que incidem sobre o prédio.
Foi a falta de coragem política, das últimas décadas, que permitiu que se chegasse a este extremo. No centro de Lisboa há muitos apartamentos cujas rendas, ainda hoje, não ultrapassam os 20 euros!
Também, é verdade que, muitos dos senhorios, não fazem nos prédios as obras que deveriam, daí o aspecto decadente de muitas das fachadas, especialmente nas grandes cidades.
Mas, o normal, é cada um se desculpar com o outro. Um não faz obras porque a renda não chega, outro não paga mais porque não tem as obras.
Acabem-se então com as desculpas. O contrato de arrendamento, entre particulares, deve obedecer a regras livres e vontade das partes. Feito nesses moldes, ambos os contraentes estão vinculados, sem pretextos, a cumprir com as suas obrigações.
Claro está que, em matéria de habitação, muitas situações socialmente gravosas há, e que não podem deixar de ser atendidas. No entanto, esse é um trabalho do Estado, de todos nós, em conjunto.
Não é razoável impor esse ónus apenas a alguns, sob a falsa verdade de que quem é senhorio é rico.
Afinal, se é assim que queremos promover o empreendedorismo e a ousadia, certamente ficaremos aquém da sociedade de que tanto precisamos.

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