sábado, 11 de dezembro de 2010

O NÃO SIMPLEX ESPANHOL

Iniciei a semana em Espanha. Como estava no sul do país, acreditei que poderia fugir à vaga de frio. Enganei-me! Frio e chuva receberam-me, sem apelo nem agravo.
Fui ao nosso vizinho com um cliente, porque precisávamos de tratar alguns aspectos formais de uma sociedade que aí se pretende criar. Para isso, era necessário obter na polícia o que denominam por NIE - número de identificação de estrangeiro.
Já na posse de senhas de atendimento, que foram obtidas às 6 da manhã desse dia, aguardávamos com resignação pela nossa vez.
Quando finalmente chegou, dirigimo-nos ao balcão de atendimento, na esperança de que a espera compensasse. Engano nosso!
Antes mesmo de nos sentarmos, a senhora funcionária partilhou connosco que faria, nesse momento, uma pausa para café. Como era nossa amiga, avisou-nos de que, pelo menos, demoraria 20 minutos. E assim foi. Partiu com mas duas colegas de atendimento, e todos aguardamos mais uma boa meia hora até que o dito café fosse saboreado.
Chegada, aproximamo-nos, quase a medo, do seu balcão e em 15 segundos dissemos-lhe ao que vínhamos. Imediatamente, pegou num formulário, nele escreveu a um canto “10 euros”, e sentenciou: Vão ao banco, paguem estes 10 euros, e então voltem cá para tratarmos do resto!
A desolação foi mais que muita. Quase uma hora de espera, para em menos de 30 segundos nos despacharem para o banco, pagar uns singelos 10 euros, e voltarmos para, só então, tratarmos do que era preciso.
Obedientes, lá fomos! A história ainda tem umas peripécias, que eu aqui me escuso de contar. No final ficou tudo tratado, mas depois de muita dificuldade. Com a crise que estamos, não seria bom tentar exportar o nosso SIMPLEX? Os vizinhos aqui do lado agradeceriam. E eu também.

CRÓNICA - UM DIA NA UNIVERSIDADE

Há dias fui dar uma aula sobre marcas a uma universidade de Lisboa. Já em anteriores anos me tinham feito o mesmo convite e, confesso, a experiência até me é simpática.
No entanto, aproveito o episódio para relatar alguns dos factos que presenciei, apenas porque os acho exemplificativos de realidades, ou melhor, mentalidades, que precisam de ser alteradas.
Uma vez que não sou professor nessa universidade, mas apenas convidado para dar uma aula em concreto, tinham-me dito que, na secretaria, logo ali me dariam todas as indicações necessárias.
Cheguei e, dos três postos de atendimento (para estudantes), apenas um estava em funcionamento, atendendo os alunos.
Como somente precisava de perguntar onde podia recolher o computador que utilizaria para dar a aula, aproximei-me de um dos funcionários cujo posto de atendimento estava “em descanso”. Ao meu “Boa Tarde”, sem sequer levantar a cabeça, respondeu azedo: estou encerrado! Perante a minha insistência em saber onde levantaria o computador, fulminou-me com um olhar entre o ódio e o desprezo, como se me fosse bater. Só quando se apercebeu que não era aluno, mas sim docente (por um dia) se dignou a, vagarosamente, dar-me a informação pretendida.
Antipatia à parte, fica a mensagem da história: Será que o senhor funcionário de secretaria não percebeu ainda que quem lhe paga (por enquanto) o salário são os alunos? Os tais que ele, pelos vistos, faz gala de tratar com desrespeito e altivez.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

CRÓNICA SEM COMPLEXOS OU PATERNALISMOS

Expulsar ciganos de um país, apenas por serem ciganos, está errado! A mesma premissa vale para todos os outros povos, confissões, etnias ou grupos, mais ou menos singulares.
É sinal de ignorância, provincianismo bacoco, ou pura e simplesmente, desonestidade e aproveitamento político. E isso não é correcto nem aceitável.
Coisa (bem) diferente é punir e expulsar criminosos. Esses não são expulsos pelo grupo a que pertencem, mas pelo que fazem, pelo desmerecimento demonstrado quanto à hospitalidade que lhes foi oferecida.
Se eu for convidado para a sala da casa de um amigo, e invés de retribuir a amabilidade com cortesia, me dedicar a partir-lhe a mobília ou a tratar mal os seus filhos, ninguém se surpreenderá que o dono da casa me convide a sair. Não pelo que sou, mas pelo que faço. E nisso, creio, todos concordaremos.
Os exemplos recentes, nomeadamente o francês, são uma mistura de vários factores e, creio que expurgada a propaganda política e o romanceamento mediático, nele encontraremos, em diferentes proporções, justiça, hipocrisia e prostituição eleitoral.
Mas levanta questões importantes, e civilizacionalmente estruturantes que merecem ser discutidas.
Por um lado subiram-se paredes porque na França estavam a ser expulsos estrangeiros para os seus países. A França vem alegar que apenas expulsou estrangeiros que não tinham uma permanência legal no país.
A ser assim, certo ou errado, nada de estranho há – não comentando o modus operandi, que à mulher de César não basta ser séria, também tem de o parecer.
Portugal prevê na sua lei o repatriamento de estrangeiros em inúmeras situações e repatria-os de facto com regularidade. Seja porque não têm uma permanência legal no país, seja porque são expulsos por ordem judicial em processo-crime.
Se a ilegalidade fosse inconsequente, não havia razões para cumprir a lei.
Devo no entanto deixar a ressalva: Tenho o maior respeito pela coragem daqueles que em situações dramáticas fogem da miséria, arriscando tudo para procurar longe vidas melhores. Mas mesmo a estes, a lei precisa de se aplicar.
Já sem ressalvas, aqueles que, visitando um país que os acolhe, aí se dedicam a praticar crimes, ficarão, justamente, sob a sujeição de, apurada a sua responsabilidade, poder-lhes ser aplicada a pena de expulsão.
Para que conste, a pena de expulsão aos que praticam crimes só ocorre nos casos em que, analisadas as circunstâncias específicas, um juiz opta – porque é uma opção – pela utilização extrema desse mecanismo legal.
Há que tratar estas realidades sem preconceitos ou xenofobias, mas também sem complexos ou paternalismos.
Tenho conhecido ao longo da minha vida várias pessoas ciganas. Com uns simpatizei, com outros nem por isso.
Em relação a alguns, indignei-me com o preconceito de que eram alvo. Pessoas com os mesmos defeitos e virtudes de todos os outros, debatiam-se com o constante rótulo de malandros e ladrões, ainda que nada mais fizessem que trabalhar, no duro, para sustentar as suas famílias.
Em relação a outros, indignei-me, mas com eles. Peritos em vitimização, olhavam para o mundo como se todos lhes devessem algo, apenas pelo grupo a que pertenciam. Aproveitadores, usavam o preconceito em seu favor, seja para pugnarem por uma impunidade que aos restantes não é concedida, seja para pedirem o que não merecem, seja para tomarem o que não é seu.
Acredito que é difícil ser cigano. Uns mais outros menos, mas muitos os olham com algum desdém.
E Portugal que durante seis séculos espalhou milhões de cidadãos pelo mundo, muitos recebidos com rejeição e antipatia, não deve ter memória curta.
No entanto, é preciso que estes problemas sejam lidados com realismo e sem complexos. Se cedermos ao populismo, então sim todos ficam a perder.
Perdemos se abrirmos excepções injustificadas a determinadas minorias, com medo do que possa parecer.
Perdemos tanto ou mais se nos deixarmos arrastar para o facilitismo e pobreza de espírito, separando por cores ou categorias, o que devia ser separado por actos e comportamentos. Aí perdemos enquanto civilização.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

CRÓNICA - DE VOLTA A ANGOLA

Muito embora tenha sempre mantido contactos, pessoais e profissionais, há uns anos que não visitava pessoalmente Angola.
Também por isso, e pela soma de relatos que me iam sendo feitos, confesso que era alguma (bastante) a minha expectativa.
Chegado a Luanda, encontrei, de facto, uma cidade diferente. Digo isto, nem tanto, pelos prédios novos, pelo aeroporto remodelado, ou pelos serviços de registo civil absolutamente modernizados que encontrei. Falo da cidade em si, das suas populações, do que se sente na rua.
A cidade cresceu, metropolizou-se!
Já não é uma pequena capital, onde ao fim de dois dias se sabia tudo o que se passava. É agora uma grande cidade, mais impessoal, com mais de tudo. Especialmente trânsito!
O frenesim é agora constante. Começa cedo e acaba tarde. Há muita construção nova – alguma a parecer aguardar melhores dias da economia – novos bares e restaurantes. Todos, por regra, caríssimos para padrões Portugueses (ou mesmo europeus).
Muito embora o combustível tenha aumentado quase para o dobro, a verdade é que com o gasóleo a 40 cêntimos de dólar e a gasolina a 60, parece encontrada a justificação para os mais que muitos grandes todo-o-terreno V6 e V8, com 3, 4 e 5 mil de cilindrada.
Relativamente aos salários de alguns anos atrás, houve também uma clara subida. Para haver uma ideia, não é invulgar encontrar uma empregada doméstica a ganhar 400 ou 500 Dólares, ou um motorista chegar aos 700.
A vida encareceu, os salários tiveram de subir.
Em relativo contraste com esta agitada realidade de Luanda, foi com enorme prazer que fiz, de carro, os cerca de 600 kilometros que a separam de Benguela.
Antes de mais, a viagem é lindíssima, sempre com o Oceano à vista. A estrada é boa, o trajecto faz-se sem sobressaltos. Fez-me lembrar as viagens Porto-Algarve, pela estrada nacional, há alguns anos atrás.
Em Benguela e Lobito (vizinhas e rivais), encontramos uma realidade bem mais calma. As ruas mais vazias e o trânsito (muito) menos intenso. Em concreto na restinga do Lobito, o cenário convida a ficar. Para sempre!
Mas Angola, com o seu petróleo, diamantes e demais riquezas, também está a sentir a crise. Nota-se no ritmo das empresas, nas conversas dos quadros, na velocidade das obras que cruzamos nas ruas. E isso, afastou muitos “investidores”. Arrisco dizer que ainda bem.
Angola, com altos e baixos, está a trilhar um percurso de progresso que, a meu ver, dificilmente será sustido.
Para isso precisa de empresários com visão de longo prazo, daqueles que não desistem com a primeira constipação da economia.
Creio que chegou a altura dos industriais, aqueles que investem para ficar, olharem com olhos de ver para o país.
Visitei a unidade fabril de um cliente meu. Por acaso em Luanda.
Vi as máquinas, o pessoal, os armazéns, tudo a funcionar em pleno, sem restrições. Já não é preciso que me convençam que é possível. Eu já vi por mim mesmo.
Curiosamente, encontrei dois empresários de Felgueiras. Ousados, olham para este mercado como uma oportunidade de, com benefícios próprios, participarem na reconstrução económica do país.
Um deles vi-o de carrinha carregada, vindo dali e indo para além, quase como que uma realidade de Felgueiras há 20 anos.
Posso estar enganado, mas apostaria convosco que, continue ele a esforçar-se, sem preconceitos, e não hão-de passar muitos anos até que aquela carrinha se transforme numa grande empresa.
Daqui a umas semanas, quando regressar, lá estarei para ver.


quarta-feira, 13 de outubro de 2010

CRÓNICA - EU E A VODAFONE

Quem tem o meu número de telemóvel sabe que sou cliente da mesma operadora telefónica há uns bons anos. Assim por alto diria que uns 10, ou quase.

Não obstante, abomino o serviço desta empresa. As minhas experiências têm sido más, quase traumáticas, e do estilo de chegar ao fim e concluir: Eles fazem de conta que não percebem, mas é de propósito. Vencem pelo cansaço e desgastam até à desistência.
Como a ideia generalizada é a de que os outros não são (muito) melhores, as pessoas acabam por ir-se deixando ficar.
Antes de mais, os chamados agentes ou representantes são mais que muitos. Sucedem-se uns aos outros, cada um desautorizando o anterior, deixando o cliente baralhado. Eu fico, confesso.
Depois, são de uma grande simpatia e atenção naqueles períodos anteriores à renovação do contrato. Telefonam, aguardam, disponibilizam-se para reuniões, sorriem e apresentam soluções. Tudo, até aquele fugaz instante em que o cliente assina. Após, por um qualquer milagre da natureza, evaporam-se. Os telefonemas desaparecem, a disponibilidade para reuniões é mínima e os problemas, que sempre existem, não há maneira de se resolverem.
Temos por outro lado o centro de atendimento telefónico da empresa. Um mimo!
Deve ser de mim, mas 90 % das vezes que usei esse número – a não ser para questões de simplicidade evidente – fui atendido com voz de frete, por pessoas que raramente conhecem as soluções para os problemas, vomitando um discurso pré-estudado, sempre, mas sempre, entrecortado com a desgraçada expressão: Pode aguardar em linha?
E lá ficamos nós à espera, embalados na música, aguardando que do outro lado o nosso interlocutor vá perguntar ao chefe aquilo que, supostamente, já deveria saber.
E não vale a pena irritarmo-nos com ele. Só nos dá cabo da pressão arterial.
Pode até dizer-se que os meninos e as meninas que nos atendem não têm culpa. Entraram há um mês e vão sair passados dois, ganham mal, não receberam a formação devida. Até pode ser, mas o que é que eu tenho a ver com isso? Não pago as contas todos os meses? A empresa é que tem de resolver o problema.
Mas não resolve, o desgraçado desespera, e o contrato de permanência renova-se. Ao estilo do pior exemplo de alguns serviços públicos, ninguém tem culpa, nem ninguém pode fazer nada. A situação fica para estudo e a culpa, é do sistema.
Feito o desabafo, retiro uma ilação, entre várias possíveis.
Compreendendo que com o crescimento das organizações e necessidades, com a alteração das realidades empresariais, já se torna mais difícil pessoalizar o atendimento. No entanto, a dimensão não é desculpa para um mau serviço. O serviço sempre foi, e continua a ser, uma valia enorme, talvez a única consistente, no sucesso empresarial.
Como exemplo, refiro – porque é de justiça – os armazéns El Corte Inglês em Portugal. Fazem gala da variedade e, principalmente, do serviço, com resultados evidentes. Com ou sem crise, vendem que se fartam.
Como parecem querer mais do que clientes para uma vez, acabam por ter clientes para muitas.


sexta-feira, 17 de setembro de 2010

CRÓNICA CASA PIA - FIM DA PRIMEIRA PARTE

Ao fim de 8 anos de processo, 5 de julgamento e 460 sessões realizadas, passando por 4 instalações diferentes, o colectivo de juízes comunicou e tornou pública a sua decisão.
Dos arguidos, apenas a única mulher em julgamento foi absolvida. Todos os outros foram condenados!
Das penas tornadas públicas, nenhuma permite a suspensão da sua execução, significando portanto que, aquando do seu trânsito em julgado, caso se mantenham nestes moldes, os arguidos serão efectivamente presos.
No entanto, estas ainda não são decisões definitivas. Estamos apenas no “fim da primeira parte”. Caberá ainda aos juízes dos tribunais superiores apreciar as questões que lhe forem colocadas pelo Ministério Público e ou Arguidos e Assistentes, reapreciando valorações e interpretações assumidas pelo colectivo que julgou o processo. E essa será, crê-se, uma longa segunda parte.
Seja ou não este o desfecho final, nada retirará ao processo uma característica marcante: Foi (e é) o que mais notícias, mais comentários, mais paixões e mais atenção social recebeu nas últimas décadas.
Pela imensa atenção que mereceu, tornou-se também um símbolo da justiça em Portugal.
Exactamente por essa qualidade que se lhe colou, merecida ou não, há cuidados que deviam ter sido reforçados. Não porque as pessoas envolvidas sejam especiais, mas porque o valor simbólico do processo se tornou incontornável.
Um deles tem a ver com os comentadíssimos atrasos. Se há opinião que se possa dizer generalizada, é, seguramente, a de que este processo peca pela morosidade. Sabendo disso, uma sessão marcada para as 9:30 da manhã devia ter começado a horas. O facto de começar mais de uma hora depois, às 10:48, circunstância amplamente noticiada pelos jornalistas presentes, aumenta estigmas que à justiça não fazem falta.
E aqui as responsabilidades distribuem-se! Seja pelos magistrados, seja pelos meus colegas advogados que, depois da hora de início, ainda se encontravam a dar entrevistas na entrada do Tribunal.
De todos os importantes factos e consequências deste processo, escolher os atrasos pode parecer risível, tanto mais que se trata apenas de avaliar o seu valor simbólico.
A verdade é que os símbolos transportam bem mais importância que aquela que uma visão superficial possa querer fazer parecer. Daí os cuidado especiais que nos devem merecer.
dc@legalwest.eu

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

CRÓNICA - À PROCURA DOS VALORES

Terminado que está o período “tradicional” de férias, é altura de fazer a reentrada com uma reflexão.
Durante o mês de Agosto foi impossível escapar às dezenas de desgraçadas notícias que as televisões se encarregaram de fazer chegar.
Devastadores incêndios provocaram por cá as (infelizmente) habituais tragédias, mas na Rússia geraram o absoluto pânico com temperaturas que há mais de mil anos não se conheciam e o número de mortos relacionados com problemas respiratórios a duplicar.
No Paquistão e China, inversamente, milhares de vidas foram levadas pelas avassaladoras cheias. Milhares sim! Não é figura de estilo.
E com tanta calamidade, continuamos todos, mais ou menos dormentes, ocupados com os nossos pequenos dramas, conformados com o facto de que a vida é mesmo assim, e não precisa de mais que uma fugaz atenção nossa.
Temo, com sinceridade, que a humanidade, especialmente nos países mais confortáveis, se tenha imunizado de sentir as verdadeiras tragédias, confundindo prioridades e miseravelmente, subvertendo, desvalorizando, ou mesmo até, perdendo valores.
E aqui assenta a verdadeira reflexão a ter.
Quais são os valores que hoje orientam e dinamizam a sociedade? Que legado estão as gerações a transmitir?
Cada vez mais oiço pessoas que respeito a lançarem alertas sobre este assunto. Há dias, num programa televisivo, o Prof. Érnani Lopes reafirmava-o, inclusive como receita para ultrapassar a crise de que tanto se fala. Entre as várias substituições de paradigma por si defendidas, uma delas era essa. A adopção e cultivo mais veementes dos valores, da integridade e do carácter.
Concordo, como aliás todos farão, com essa necessidade. Mas o desafio não é esse, o de concordar. O desafio real, o que pode de facto trazer algo de novo à equação é o que eu, e todos os outros concordantes, faremos de diferente, no nosso dia-a-dia, já amanhã, para concretizá-lo.
Se é verdade que o esforço individual de cada um, por si só, nada mais é que uma minúscula gota no oceano, não deixa de ser absolutamente incontestável que todas as grandes caminhadas começaram com um passo.
O que tem faltado é a capacidade de, por um lado, acreditar que é possível fazer diferente, e mais importante, fazer melhor.
Por outro, conseguir contagiar!
Finalmente, e sendo este exercício meramente reflexivo, preocupo-me especialmente com todos aqueles que, como eu, são pais.
E essa preocupação prende-se com o facto de, até determinada idade, esses pequenos e maravilhosos seres beberem dos mais velhos, mormente dos pais, as certezas das suas vidas.
São as nossas escolhas – dos pais – que moldam os valores, o carácter, a integridade deles – dos nossos filhos.
Essa responsabilidade é talvez a mais valiosa e importante tarefa para que fomos convocados, e receio não estarmos a ter um desempenho extraordinário.
Quando vemos as novas gerações muito mais preocupadas com o que têm do que com o que são, significa que aqueles que tinham o dever de lhes explicar que essa inversão de valores não lhes trará felicidade, mas apenas bajulação interesseira, devem entregar mais de si a esse esforço.
Vamos arregaçar mangas e fazer obra. Sempre há-de ser mais importante melhorar o que somos do que enriquecer o que temos!
dc@legalwest.eu

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Código dos Impostos Especiais de Consumo


O novo Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC),Decreto-Lei n.º 73/2010, clarifica as regras de tributação e procede à simplificação das normas e procedimentos relativos ao acompanhamento da circulação dos produtos sujeitos a imposto, bem como da autorização dos entrepostos fiscais previstos no CIEC.

Saiba mais: dc@legalwest.eu

quinta-feira, 1 de julho de 2010

CRÓNICA: DA OPORTUNIDADE À NECESSIDADE

Estou um pouco preocupado com o nível de entusiasmo, ou falta dele, nos empresários do calçado.
Conversei com vários no decorrer desta semana, e há um tipo de nuvem negra nos seus discursos. Ao que me foi transmitido, há como que um triangulo que se aperta, dificultando os seus movimentos.
Um dos vértices é a conjuntura actual. Como é óbvio, esta indústria não lhe é imune e muitos têm visto o volume de negócios reduzir-se por razões de retracção económica. Um outro prende-se com o próprio estado, via fisco. Como o orçamento estatal vive na indigência, há uma pressão enorme junto dos serviços para que cobrem. E estes cobram, a torto e a direito, o que é devido e o que não é, indo buscar a quem tem, pois só assim alcançam a medalha e cumprem os fatídicos objectivos. O último tem a ver com o comportamento da banca. Ao seu melhor estilo, se antes viciaram irresponsavelmente as empresas e particulares com crédito mais ou menos indiscriminado, num mar de facilidades, aparecem agora, de repente e sem aviso, como virgens ofendidas, fechando as torneiras de forma quase cega.
Este conjunto de factores, até porque simultâneos, estão na base de um pessimismo empresarial que a ninguém favorece.
Mas a verdade é que não estamos em tempo de choros, mas sim, de busca de alternativas e novas oportunidades.
Como já tenho dito, quase à exaustão, acredito no futuro das relações entre Portugal e os restantes países lusófonos.
Se antes fui da opinião que economias ascendentes como a de Angola eram para os empresários Portugueses uma excelente oportunidade, vou hoje mais longe, ao considerar que são uma verdadeira necessidade.
Os povos lusófonos, não obstante as suas especificidades e diferenças, têm mais em comum do que a separá-los.
Se mercados emergentes como Angola e Moçambique têm espaço para crescer e oportunidades para explorar, a experiência do tecido empresarial de Portugal e Brasil pode potenciar valias cujo desaproveitamento seria não apenas despropositado como incompreensível.
É verdade que é às empresas que compete perseguirem novas oportunidades e mercados.
No entanto, nenhum mal viria a mundo, nem à indústria do calçado, que as entidades públicas – incluindo as locais – dessem o seu contributo, criando laços e condições institucionais que facilitem este desígnio empresarial.

HISTÓRIA DE VIDA COM HISTÓRIA


História de, Afredo Casimiro, um homem que nem sequer conhecia, mas muitissimo interessante a entrevista. Recomendo vivamente a leitura no Público.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

CRÓNICA - HÁBITOS E PRODUTIVIDADE

Há entre nós Portugueses, tantos que defendem que um dos problemas do país, se não o principal, é a falta de produtividade.
Os estudos comparativos existentes não nos são simpáticos. Sistematicamente, arrastam Portugal para os lugares do fim, concluindo que demoramos mais do que os outros, para fazer menos do que os outros.
Não há razão para ficarmos contentes. Nem quietos!
Lembrei-me de escrever sobre este assunto, imagine-se, na sala de espera de uma clínica de análises médicas. Eram 10:30, e eu ainda aguardava para fazer uma ecografia que havia marcado, semanas antes, para as 9. Fui chamado quando acabava de escrever o primeiro parágrafo deste artigo!
Pediram-me para tirar o casaco, desapertar as calças, e, surpresa, voltar a esperar. Finalmente, consegui iniciar o exame. Três minutos depois, diagnóstico de tudo normal, fui à minha vida. E assim se passou uma manhã.
Mas nem só nas clínicas de análises se espera.
No passado dia 4 de Março foi greve da função pública. Tinha, na manhã desse dia, julgamento marcado. Para as 9:30 da manhã, como infelizmente é habitual, havia para o mesmo Juiz, 8 julgamentos. Sim, todos à mesma hora! Como se isso fosse uma tarefa possível.
Mas adiante! Das outras secções e Juízos, depois de uma pequena HORA de espera, advogados, arguidos, queixosos e testemunhas foram sendo dispensados, uma vez que a greve dos funcionários tornava inviáveis os julgamentos.
Todos, menos do juízo e secção do meu processo! Após quase duas horas de espera, sem qualquer justificação, fomos chamados à sala de audiências para, imagine-se, sermos informados que o julgamento seria adiado por causa da greve. E lá foram todos, felizes e conformados com uma manhã perdida, às suas vidas.
Não há repartição pública, serviço de finanças, consultório médico ou escritório de advogados que se preze, no qual o desgraçado do utente não tenha de esperar algum (bastante) tempo. Mesmo que tenha agendado e reconfirmado a sua hora. Faz parte, é fino, e as pessoas conformam-se! Fazem mal!
Aqui há uns anos, um amigo meu bastante mais velho, contou-me uma história que me apetece repartir convosco.
Certo dia, havia marcado uma reunião com o director de uma grande empresa, na qual estava confiante de fazer um bom negócio. Chegou cinco minutos mais tarde, e, não obstante pedidos de desculpa e insistências, não foi recebido. Meio frustrado, remarcou a dita reunião para a semana seguinte. No dia em causa, chegou à hora marcada e foi prontamente recebido. Cinco minutos depois estava a sair, com o negócio fechado e uma lição de vida. Muito se consegue fazer em cinco minutos, daí a sua importância.
Ouvi também, alguma vez sem me recordar bem onde, que a maior falta de respeito é fazer alguém esperar. Se o tempo é, seguramente, o bem mais escasso de que dispomos, bem se compreende que “roubar” algum ao nosso semelhante, é privá-lo de algo valiosíssimo, de impossível reparação.
Usando a justiça como exemplo, apenas porque me é mais próximo o tema, arrisco dizer que aquilo que os cidadãos mais temem quando se vêem arrastados para um processo judicial, é a perda de tempo. Do seu tempo!
Não é de serem condenados, não é do ritual de togas e becas, nem sequer é da contraparte. É de saberem, à partida, que vão ser chamados para perderem dias inteiros, fechados numa sala de testemunhas, para nunca serem ouvidas à hora que consta da notificação, quase nunca no dia da notificação, e, em caso de falta, não escaparem da não tão pequena multa.
Confesso que não sei se é assim nas outras partes do mundo, espero bem que não. Mesmo que fosse, nada de bom daí adviria. Apenas saberíamos que há outros, tão errados quanto nós.
E, igualmente necessitados de mudar!

segunda-feira, 22 de março de 2010

CRÓNICA - O PODER DO EXEMPLO


Assistimos, traumatizados, ao mediatizado suicídio de Leandro. Parece que este jovem de Mirandela, com apenas 12 anos, não aguentou mais a humilhação e entregou-se ao Tua.
O país acordou, como que surpreendido, com esta violenta realidade escolar e, entre pedidos de responsabilidade à Escola e aberturas de averiguações nas quais já ninguém acredita, provavelmente o assunto morrerá, também ele, levado pelo rio.
Leandro era aluno, violentado por colegas alunos. Mas não são só eles que soçobram ao dia-a-dia escolar.
Também Luís fez manchetes de jornal. Professor em Sintra, vivia em terror com as aulas de Musica que aí leccionava. Aos 51 anos, parou o carro na ponte 25 de Abril, e atirou-se ao rio.
A primeira vez que me deparei, mais seriamente, com a expressão Bullying, foi há uns anos atrás num processo em tribunal. Fui nomeado para defender uma criança, pré-adolescente, num processo em que lhe eram imputadas uma série de crueldades, graves, que em conjunto com outros tinha infligido a miúdos, ainda mais novos e mais frágeis.
Li o processo antes de conhecer o miúdo e, confesso, fiquei impressionado com o que vinha relatado naquelas páginas. Imaginei um animal precoce, violento e irrecuperável. Afinal não, era apenas um miúdo parvo, influenciável, autor de uma piada sem graça nenhuma, especialmente para os coitados que foram suas vítimas. Mas só isso!
Eu, como quase todos, também já fui criança e também andei na escola.
Sempre houve abusos dos maiores para com os mais pequenos. Sempre houve calduços, “toques-de-orelha”, humilhaçõezitas, mais ou menos mesquinhas. Receio bem, que sempre irão haver!
O que me preocupa, no entanto, é o à vontade com que os insurrectos de agora encaram as suas tropelias. Não há sentimentos de culpa nem receios de consequências. É como se nesta nova era, as coisas fossem assim mesmo.
Mas infelizmente há! E é bom que rapidamente as consequências apareçam, para que se inverta esta maré.
No entanto, a minha preocupação não diminui quando vejo as opções que se apresentam para resolver o problema. Basicamente são de duas naturezas: Uma, mais pseudo-intelectual, defende que as crianças são por natureza irreverentes, que as escolas são (apenas) espaços de recreio e libertação de ansiedades. Por isso, nada se deve fazer de carácter repressivo. Outra, mais radical, inclina-se para o regresso à autoridade da escola, via violência e castigo físico. Se não vai a bem, vai à reguada. Não creio que nenhuma nos traga melhores dias.
É verdade que a irreverência dos jovens não traz desgraça ao mundo, assim como é verdade que as (poucas) reguadas que levei não me deixaram qualquer trauma.
Concordo que um elemento central da inversão deste processo de degradação da vida escolar, e consequentemente das gerações que dela saem, é a disciplina. No entanto, sugiro a todos que aprofundem o significado da palavra. A vertente do castigo físico é apenas uma visão limitada do conceito. Na realidade, disciplina é a instrução a ser administrada a discípulos. Tem a ver com dar o exemplo!
Talvez valha a pena reflectirmos sobre o exemplo que estamos a dar, sobre que discípulos são estes que estamos a deixar, antes de serem tomadas decisões imediatistas e efémeras.
Sendo apenas uma vertente do problema, partilho convosco uma interessante frase de Joubert: “As crianças precisam mais de modelos do que de críticas”

quarta-feira, 10 de março de 2010

CRÓNICA - O ERRO DA COMPENSAÇÃO


Estamos a viver uma era de contestações.
Até o planeta está contestatário, manifestando-se com terramotos, maremotos e inundações.
No caso dele, Planeta, receio que não seja totalmente desprovido de razão.
Por outro lado, vemos contestações sociais das mais diversas. As empresas encerram, os trabalhadores são despedidos, as famílias desesperam. Este é um cenário cada vez mais vulgar, para tristeza de todos.
No caso português, esta semana não foi de boas notícias. Entre comparações com a Grécia e escândalos políticos, diz agora um relatório do EUROSTAT que o desemprego em Portugal já ultrapassou os 10%, barreira psicológica importante.
Neste cenário, todos parecem querer encontrar uma tábua de salvação para o seu problema, adoptando, por vezes, comportamentos que não seriam os mais desejáveis.
Infelizmente, o Estado, em certos aspectos censuráveis, lidera pelo exemplo.
Aproxima-se a altura dos reembolsos de IRS.
Também as empresas, mensal ou trimestralmente, deparam-se com o que se tornou o calvário dos reembolsos de IVA.
Quer num caso quer no outro, é dinheiro dos contribuintes, que se veio a demonstrar ter sido pago em excesso, e por isso, deverá ser devolvido.
Acontece que, fruto de uma má interpretação, que conduziu a uma má prática, o fisco tem em muitos casos privado os beneficiários do reembolso do seu dinheiro, usando uma figura da lei chamada de COMPENSAÇÃO.
Esta figura, quando bem aplicada, não só não tem nada de mal como é muito útil. Em palavras simples, o que ela permite é que, sempre que o Fisco tenha que devolver dinheiro a um contribuinte que deve impostos ao Estado, e não os paga, pode a máquina fiscal usar o dinheiro do reembolso para, digamos assim, saldar as suas contas. Até aí, nada a apontar.
Acontece que, nem sempre os valores reclamados pelas finanças são, de facto, devidos.
Há inúmeros casos de enganos, de más avaliações, de erros de cálculo. Todos os conhecemos!
Por isso também, é dado ao contribuinte a oportunidade de se defender desses erros.
Nessa medida, a correcta interpretação da lei, que aliás já está confirmadíssima pelos tribunais, implica que o estado só poderá compensar créditos após estarem ultrapassados os prazos concedidos ao contribuinte para se defender.
Parecerá a todos do mais profundo bom senso! Acontece que o conceito de bom senso não é uniforme, e a máquina fiscal tem-se pago com dinheiro dos reembolsos antes que o contribuinte se possa defender.
Esse comportamento abusivo é ilegal, e deve merecer da parte dos lesados a competente reclamação.
É verdade que o deficit do Estado continua a crescer! O que não se pode fazer é, sem justificação, baixar a dívida do estado à custa do orçamento das pessoas!

sexta-feira, 5 de março de 2010

CRÓNICA - JAMES BAIN - 35 anos de Injusta Prisão

A história de James Bain podia ter sido mais uma entre muitas iguais.
Podia ter entrado nos vinte anos como qualquer semi-adulto. Com as ansiedades e inseguranças naturais dessa altura. Também, com a jovialidade e a força de mover montanhas, natural da idade. Podia ter namorado com as colegas de escola ou trabalho, acompanhado o envelhecer da mãe, ido à missa aos domingos.
Podia ter sentido o vento frio de inverno, o sol quente de verão. Seria normal também que de um desses namoros, surgisse algo mais sério, e o privilégio de ter filhos sobre si recaísse.
Chegaria aos trinta sem a força dos vinte, mas com a maturidade que as responsabilidades trazem. Dedicar-se ia a vencer as adversidades da vida, beijaria os seus filhos de manhã, acompanharia a sua mulher na refeição da noite. Não seria, porventura, feliz nem infeliz. Mas viveria a sua vida.
Entraria nos 40 achando que a vida o surpreendeu. Afinal, corre mais veloz que a sua percepção. Os filhos são agora mais autónomos, mais independentes, mas também, mais problemáticos.
No emprego, ocuparia uma posição de maior responsabilidade. Era já um “sénior”, experiente na sua área, moderador dos conflitos dos novos elementos que, cadenciadamente, iam substituindo os que entravam na reforma.
Entraria nos 50, nostálgico dos seus 20, e 30. Contaria aos amigos, os feitos da juventude. Recordar-se-ia com a mulher dos primeiros anos da vida conjunta, do nascimento dos filhos, das suas primeiras idas à escola, das iniciais palavras, dos primeiros sustos.
Deixaria que a brisa lhe roçasse a cara com as experiencias vividas, e sorriria por umas, choraria por outras.
Mas não foi essa a vida de James Bain!
Aos 19 anos de idade, foi preso!
Acusado de raptar e violar um rapaz de 9 anos, viu nesse fim de adolescência, o seu mundo ruir.
De repente, tudo e todos se viraram contra ele. Deixou de ser um rapaz querido, para passar a ser um pária, uma aberração da sociedade, um vil animal que se aproveitara de uma pequena criancinha.
A verdade, é que não tinha sido ele, facto que apenas foi apurado após 35 longos anos de cárcere.
E por um erro da Justiça, o livro da sua vida viu muitas das mais importantes páginas rasgadas.
Nem tão pouco os 50 mil dólares que receberá, por cada ano passado na prisão, o compensarão da sua perda. Aliás, não é dinheiro o que ele mais anseia. É tão só, sentir o vento da liberdade afagar-lhe o seu rosto de 54 anos, a maior parte dos quais, vividos em injusta reclusão.
Esta triste história não pretende arranjar culpados, ou diminuir a confiança na justiça, que já tão fustigada anda.
Também nos tribunais, o que lá se faz, é feito por homens. E nada há feito por homens que seja imune ao erro.
No entanto, nesta onda, cíclica, onde ora se critica o excesso, ou a falta, de garantias que os processos judiciais comportam, vejo com tristeza uma ânsia desumanizada em condenar, punir. Pensa-se, e mal, que só quem condena faz justiça.
Claro está que, se há vítima, haverá, quase sempre, culpado. Pode é não ser, e não é muitas vezes, quem as circunstâncias fazem parecer que é.
Porque, genericamente, melhor modelo de justiça ainda ninguém foi capaz de apresentar, só há uma forma de evitar que mais erros destes aconteçam. Tratar cada caso com abertura de espírito, e deixar que as provas levem a conclusões.
O problema é que, vezes demais, são as conclusões que andam à procura das provas!

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

CRÓNICA - AS MENSAGENS DA MARTA

A história da Marta não é especialmente inovadora.
De segunda a sexta, Marta trabalhava com mais 4 colegas no escritório da CPS Lda. Convenhamos que não era a mais dedicada funcionária, nem sequer a mais desenvolta da equipa. No entanto, desempenhava o seu papel!
Era hábito da Marta e das suas colegas almoçarem juntas, todas as terças-feiras, na tasquinha do João, restaurantezinho simples, mas acolhedor e em conta.
Religiosamente, lá por volta das 12:30, as 5 amigas/colegas paravam as suas tarefas e saíam para o almoço colectivo da praxe. No escritório, ficavam em suspenso os compromissos profissionais e as zangas com o chefe.
Desde há alguns meses, eram insistentes os diferendos entre Marta e o Sr. Joaquim. Este, homem dos seus cinquenta e muitos, não se dava bem com a rebeldia de Marta. Afinal, era ele o gerente competindo-lhe definir e controlar o bom desempenho de todos os subordinados. Para isso, considerava ele, nenhum mal havia em, de quando em vez, vasculhar as secretárias, e até os haveres pessoais, da sua equipa. Nenhuma altura mais ideal que as horas de almoço de terça-feira, onde sabia que todas estariam na tasquinha do Sr. Joaquim.
Nesse dia, Marta tinha trazido uma carteira grande, tipo saco. Daquelas que as mulheres usam para demonstrar aos homens que é possível sair de manhã e levar “apenas” o equivalente à tralha necessária para uma viagem de um mês. Também por essa razão, não levou a carteira consigo para o restaurante. Pegou em 15 euros, e deixou-a a repousar na sua cadeira de trabalho.
Pouco mais de 10 minutos passavam quando o Sr. Joaquim entrou na sala de Marta. Estava determinado a encontrar algo que confirmasse as suas suspeitas. A insurrecta funcionária andava a virar as suas colegas contra o chefe. Ele sabia-o. Tinha a certeza. Apenas lhe faltavam as provas.
Após uma minuciosa investigação às gavetas da Marta, o Sr. Joaquim decidiu entrar em terreno mais pantanoso. Mas os seus fins justificavam os meios.
Abriu a mala de Marta, encontrou o telemóvel dela e, de imediato, lhe começou a ler as mensagens. As primeiras eram irrelevantes, pelo menos para o que pretendia.
Numa, ficou a saber que o filho de Marta tinha sido expulso da aula de matemática. Na outra, que ao marido de Marta foi diagnosticado um nódulo suspeito, estando a aguardar o resultado da biopsia. Numa terceira, tomou conhecimento que Marta estava ligeiramente atrasada na 7.ª prestação de um crédito pessoal que havia pedido.
Assim continuou até que finalmente se fez luz. Joaquim encontrou uma mensagem que Marta havia enviado às suas colegas, na qual proferia as mais injustas e ofensivas críticas ao seu chefe. Chamava-lhe de parvo para cima, chegando ao ponto de fazer referências redutoras à dimensão de certas partes da sua anatomia.
O Sr. Joaquim, que deveria sentir-se contente por finalmente ter descoberto a prova que lhe faltava, estava apenas e simplesmente irado.
Sem espaço para manobras ou desculpas, despediu Marta, sem apelo nem agravo. O respeito pelo chefe é uma obrigação do funcionário, e a sua falta, justa causa para despedimento. Ele agora tinha a prova!
Muito aconteceu durante os meses seguintes e, hoje, Marta continua a trabalhar na CPS Lda. Quem já lá não está, é o Sr. Joaquim!
Se é verdade que Marta faltou ao respeito ao seu chefe, e isso é não só inadmissível como razão suficiente para ser despedida, é também verdade que essa informação foi obtida de forma ilegal. O Sr. Joaquim não tinha o direito de vasculhar as mensagens pessoais da Marta e, mesmo assim, achou que os fins justificam os meios.
É preciso ser firme e demonstrar que, por muito que por vezes seja injusto ou nos custe, e por muito até que os visados merecessem, os fins não justificam os meios.
Quebrado esse princípio, a viagem colectiva até ao abismo é demasiado veloz.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

CRÓNICA - HONRA POR UM TELEMÓVEL

A propósito de uma arrastada “novela” judicial, que agora ganhou novo fôlego, li recentemente um título de jornal onde se questionava para que lado a balança deveria pender, quando se pesassem dois importantes direitos: O da liberdade de expressão e o do direito à honra e bom nome.
Não me apetece contribuir para perpetuar o referido “romance”, pelo que em relação a esse caso não me vou pronunciar.
Aproveito no entanto a deixa, para reflectir sobre o que considero ser, uma desvalorização injusta que o direito à honra e bom nome parece merecer quer da legislação existente, quer da prática jurisprudencial.
Atentemos as seguintes realidades:
A legislação penal Portuguesa prevê que quem imputar factos ou dirigir palavras a outra pessoa, ofensivos da sua honra ou consideração, pode ser punido com pena de prisão até 3 meses.
Já relativamente aos “danos patrimoniais”, prevê a mesma legislação que quem subtrair e se apropriar de coisa alheia, o conhecido furto, pode ser punido com prisão até 3 anos.
Ora na prática o que aqui temos é que se alguém me tirar o telemóvel, sem qualquer tipo de violência que seja, esse alguém poderá vir a ficar preso até 3 anos. Já se a mesma pessoa se dirigir a mim com as mais cruéis e torpes insinuações, ofendendo-me da pior maneira que seja, no máximo poderá ser punido com prisão de 3 meses.
Passamos de 3 meses para 3 anos. É seguramente um passo de gigante.
Não falo pelos outros, mas no que a mim diz respeito, confesso que me importaria muito menos ficar sem o telemóvel, do que ver a minha honra e consideração enxovalhadas por um energúmeno qualquer.
Quero com este exemplo significar, que a honra das pessoas, o seu bom nome e consideração, são cada vez menos valorizados e, consequentemente, protegidos.
Alturas houve, em que o nome das pessoas era a mais preciosa herança que legavam aos descendentes, suplantando a sua importância a qualquer outro activo. Hoje, miseravelmente, esse brio está postergado para uma condição de menor importância, dando-se maior valor a qualquer bugiganga que se guarde lá por casa.
Há que mudar este paradigma!
Que se vão os anéis e fiquem os dedos. Ou melhor, que se vão os telemóveis e fique o que de mais íntimo e inalienável o ser humano tem, a sua dignidade.
Voltando à questão inicial, não deve, por regra, nenhum dos interesses ser subalternizado ao outro. Nem isso é preciso!
O direito à liberdade de expressão, especialmente caro dada a sua juventude em Portugal, é tratado como se a nenhum outro devesse ceder.
Claro está que é inquestionável a sua importância. No entanto, como todos os direitos deve ser usado com responsabilidade, sob pena de, pelas consequências nefastas que o seu abuso vai granjeando, mais cedo ou mais tarde passar de sonho a pesadelo, retirando-se-lhe o brilho que deve ter.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

1.º CONGRESSO UALP

Está agendado para os dias 22 a 24 de Março deste ano, o 1.º Congresso internacional dos Advogados de Língua Portuguesa.
Para todos aqueles que vêem no incremento das relações no espaço da Lusófonia uma oportunidade, e até um dever, esta iniciativa poderá significar um positivo contributo. Como todas as iniciativas desta natureza, a sua importância medir-se-á, também, pela adesão dos seus destinatários. Fica pois o apelo para que advogados destes 4 continentes se juntem, estreitando laços.
dc@legalwest.eu

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

PORTUGAL - PROPOSTA ORÇAMENTO DE ESTADO 2010


Foi ontem entregue na Assembleia da República a proposta de Lei do Orçamento do Estado Português para 2010.
Pode aqui consultar o documento.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

PROIBIÇÃO DE TAXA MULTIBANCO


Depois de rumores diversos sobre a introdução de novas taxas para a utilização do cartão multibanco, quer para levantamentos quer para pagamentos, está agora consagrada legalmente a proibição de cobrança de encargos pela prestação de serviços de pagamento e pela realização de operações em caixas multibanco. O Decreto-Lei 3/2010 explicita que está impedida a cobrança de encargos pelas instituições de crédito nas operações, designadamente de levantamento, de depósito ou de pagamento de serviços, em caixas automáticas. Por outro lado, também os beneficiários de serviços de pagamento nas operações de pagamento através dos terminais de pagamento automáticos estão impedidos da cobrança de quaisquer encargos adicionais.

REPRIVATIZAÇÃO DO BPN

Após uma decisão controversa de nacionalização, foi agora publicado em Diário da República o Decreto-Lei n.º 2/2010 que aprova o processo de reprivatização da totalidade do capital social do BPN - Banco Português de Negócios, definindo esse diploma que para efeitos da determinação do preço base de licitação no concurso público, compete ao conselho de administração do BPN propor ao Ministro de Estado e das Finanças o valor da empresa a reprivatizar, com base em avaliação efectuada por duas entidades independentes.